sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Crónicas da Serra Leoa, #2 - When the Night becomes the Day

(para ler ao som de: X-Wife – I live abroad)

Meus amigos aqui chove, chovem cães e gatos (raining like cats and dogs) muitas são as noites que passo na varanda a contemplar o magnifico espectáculo de relâmpagos e autenticas trombas de água que o calor da noite mistura. A luz dos relâmpagos transforma a noite em dia, tal como as lanternas led que os chineses vendem por aqui, fica branca. Mas a época das chuvas está a acabar e já começo a sentir a califa africana, o calor!



Há muitos cães.


Cães vadios, extremamente preguiçosos (também li perigosos, culpa do extremamente) e muito easy going. No outro dia, um antigo professor de inglês por terras de sua majestade, nativo, deu-me uma explicação para esta atitude passiva dos cães. "A guerra matou muita coisa, até o latir dos cães" disse-me. Os mercenários, miúdos drogados e brainwashed com filmes de guerra, atacavam de noite e o ladrar dos cães denunciava-os, a resposta era obviamente a morte do cão. Então estes animais aprenderam a não ladrar e a ser bastante submissos. Existem também relatos de que os comiam, mas não vou escrever sobre isso.




Descobri uma raça pior que os chineses… os portugueses, estão mesmo em todo o lado! Tenho portanto um compatriota expatriado, xpat no dialecto local, piloto de helicópteros. Pode ser que tenha sorte e vá perceber de onde vêm os relâmpagos.


A guerra marcou mesmo este povo e ainda está bem visível nos rostos carregados das pessoas. Hoje li no jornal que esteve cá a actriz Eva Mendes em prol das mulheres maltratadas e violadas durante a guerra. Perguntei o que era feito das crianças tornadas mercenárias à força, a resposta foi "espero que estejam bem longe ou mortas". Não foi fácil ouvir isto, pois as crianças não tiveram culpa directa nos seus actos, mas mais difícil foi, para quem o disse.


A luz está constantemente a falhar. Por culpa desta sistemática falha o sistema de pagamento da luz é do tipo, you pay what you get, então à semelhança de um simples carregamento de um serviço de telecomunicações móvel (telemóvel), aqui compram-se cartões de electricidade com determinado plafond que são inseridos no contador.



O sistema de transportes públicos é… não é. Temos carros-táxis, mas conhecidos como carros que o resto do mundo já não quer, e moto-táxis, os Okada que tal como o nome com semelhanças nipónicas sugere são uns autênticos kamikaze. Ainda não tive o privilégio de embarcar em qualquer um deles, mas em seu tempo, e porque o trânsito assim o obriga, penso que terei de recorrer à moto chinesa com um condutor que tem mais vontade que a própria. 



O meu primeiro contacto na Serra Leoa, amiga e dona da casa onde vivo, fez anos. Organizou-se uma festa cá em casa e mais uma vez vi-me cercado por gente influente no país, generais, ministros e a candidata da Serra Leoa a Miss West Africa! O seu irmão, fez um discurso em honra da aniversariante, bastante estadista no inicio e descontraído no final, ao ponto de incluir a minha aversão à comida picante. Eu até tolero o que nós chamamos de picante, agora o picantes deles…



Posso dizer que já fui uma quase vítima de esquema de vigarice. Estava a almoçar e um senhor bem-parecido começou a trocar uns galicismos (que palavra) comigo. Queria dinheiro para a sua injecção de insulina e disponibilizava-se a ir comigo à farmácia para efectuar a compra. Ok, confesso que quase tive pena do homem, mas o dono do restaurante, libanês (são aos magotes em West Africa), abriu de tal forma os olhos quando olhei para ele que era impossível cair na armadilha. No dia seguinte contou-me que o Guineense (Conakry) conseguiu extorquir 200$ a outro europeu, e comentou, "vocês europeus são tão patinhos". Foi tudo um quase.




As praias. Sierra Leone fica voltada para o Atlântico e tem uma costa considerável, logo seria de esperar que tivesse boas praias. Confere. Já tive a sorte de poder dar um bom mergulho e a água é uma sopa. Já reservei os meus fim-de-semanas para o camarão, ou lagosta e caldo de Atlântico até o meu regresso.


Abreijos

By Miguel Sena

1 comentário:

  1. Esta crónica é coisa para ser chamada de genial :) Vou estar atenta, e vou seguir essa vida em Serra Leoa.

    ResponderEliminar